Porque agora vemos por espelho…

“Nós enxergamos tudo num espelho. Agora você teve um vislumbre de como é o outro lado do espelho. Não posso lustrar e polir o espelho inteiro. Se pudesse, você veria até mais coisas; porém, não enxergaria mais a você mesma.”

Jostein Gaarder em “Através do Espelho”

Não vou negar, a cada dia me assombro mais um pouco com o não encantamento diante da vida! Como se tudo a nossa volta fosse completamente normal! Parece que deixamos de nos deslumbrar. E até mesmo de questionar…

Até pensamos que sim, mas na verdade temos engolido tudo o que nos é proposto sem nos perguntarmos quais são as verdadeiras intenções. O que está por trás do que querem nos impor. Sabe, não quero parecer nostálgica aqui, mas tenho saudades de quando ficávamos com uma pulguinha atrás da orelha a partir do momento em que notávamos que um assunto era demasiadamente abordado pela mídia. E normalmente, nos posicionávamos contra, aliás muito contra, até mais averiguações.

Hoje, a impressão que tenho é que pensamos que a manipulação não existe, que isso é coisa de gente maluca que pensa que tudo é teoria da conspiração. Acreditamos que realmente damos as cartas. Porque agora somos vistos e ouvidos (qualquer um pode ter um blog, um canal, por exemplo), assim, acreditamos que o que tem sido dito é a nossa voz, e nos tornamos cada vez mais com-formados.

Fico realmente entristecida ao constatar tudo isso! Tínhamos tanto medo de ser gado, massa de manobra, e penso que nos tornamos exatamente o que mais temíamos.

Dizem que hoje podemos escolher tudo, que cada um pode ser como quiser. Mas pense bem, se uma criança negra diz que se enxerga uma criança branca e não aceita a sua cor, o que seria feito com ela? Talvez os pais fossem orientados a levá-la a um psicólogo, até mesmo um psiquiatra. Tentariam verificar o que provocou isso! Talvez  trabalhassem a identidade dessa criança, a questão do pertencimento, o legado da cor, a beleza real…

Mas, quando uma criança diz que não se sente um menino mas uma menina, dizemos que ela pode ser o que quiser. A grande pergunta é:

Porque também não trabalhamos com essa criança sua identidade, a questão do pertencimento, seu legado, a beleza real…

A verdade, é que todos somos limitados. Você não escolhe sua estatura, em que família vai nascer, classe social, que habilidades terá, doenças genéticas, seu país de origem… Faz parte da vida lidar com tudo isso. E ninguém, acredite, ninguém é feliz se não lidar com essa parte da vida que não pudemos escolher.

E claro que existem inúmeras outras coisas que você pode mudar e deve. Mas parece infelizmente, que temos sido levados a querer mudar exatamente o que NÃO vai fazer diferença alguma ao “status quo”, embora essa mudança nos dê a impressão de um grande empoderamento.  O triste é que é somente impressão mesmo. Afinal, ao nosso redor fica tudo igual. Já a gente mesmo… mas claro que não podemos falar disso, porque sempre publicamos fotos onde tudo é perfeito. Ou você acha que alguém que não aceita a sua própria cor, tipo de cabelo ou seu olho puxado é realmente feliz?

Acredito que temos que mudar sim, primeiramente não concordando quando dizem que há algo errado com a gente! Que precisamos mudar, afinal todo mundo está mudando também. Precisamos voltar a questionar. Aliás, questionar sempre.

E, porque não,  acreditar que somos incríveis. Independente da cor, sexo, necessidades especiais (falo aqui como deficiente auditiva sabe), características, nacionalidade…

ENFIM

“Você poderia se dar parabéns porque você é um ser humano que vem fazendo parte de uma viagem extraordinária pelo firmamento , em torno de um sol de fogo. Aqui você experimentou uma fração da eternidade. Você viu o universo Cecília! Você foi capaz de levantar a vista desse desenho do qual você faz parte e ver a sua própria majestosa grandeza no enorme espelho do céu.”

Jostein Gaarder em “Através do Espelho”

P.S. Palavras de alguém que ainda percorre um longo caminho da autoaceitação em muitíssimos sentidos.

 

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